sexta-feira, 9 de janeiro de 2015

Aos batuques nas panelas no quintal

Sinto a fundação – sua imagem me diz muito sobre as minhas aptidões e desejos mais terríveis que sinto por ainda não ter disposto a arder no mundo com tanto fluxo e intensidade que eles exigem e merecem. Temos tempo, algo me diz. O tempo está acabando, me diz uma velha negra, meio ave meio gente.
Batuco as panelas dispostas na bancada de cimento do quintal. Está sol, fim de tarde, uma colher de pau ou qualquer outra coisa me são para baquetas.
Minha avó se desespera ao fundo – isso que me pediu que parasse.
Visualizei uma coisa grave, talvez o recalque de meus sentimentos musicais seja um esticamento-eco desse pedido desesperado. Ele não foi meu, não me é.
Sempre pelos cantos, me vejo, batucando, dançando e cantando – estou num palco: piso de taco do meu primeiro quarto de infância, toco multidões a minha frente, estou sozinho e de pijama, cai água do chuveiro e vejo as ferrugens do box velho e desajeitado.
Acessei aqui com a acuidade que lhe escrever me doa, um de meus maiores processos de ilusão. Posso dizer que muitas vezes, visitei mundos sem sair de minha casa-corpo. Tenho que, mesmo envergonhado, lhe confessar que até hoje me pego nisso, quando acesso o meu núcleo permanente de infância e, assim transponho as pilhagens do mundo - tocamos origens de mundo aqui, coisas nossas, benfazejas e, por mais que não tenhamos feito grandes esforços para nos concretizarmos, sei que nos somos, numa substância real e física .
Desfaço aqui todas as amarras para ser fluxo onde o magma e seus adventos passam e se manifestam em seu âmbito. Estico. Movença.
Tu sabes, que acessamos aqui uma liberdade mineral. E é nisso que me despeço, grato.
Do sempre seu, B.P.

  

Um comentário: