Foi quando passei, de madrugada,
na última semana, na Alameda Yaya, que tentei te achar. Sinto que o terreno
ainda está lá, aberto e vasto – na frente dele pude devanear e visitar as imagens
que vou lhe contar aqui seguindo o seu rastro: em baixo da mesa do refeitório
com mais uma molecada, toco meninas de minha idade, todos se tocam – cheiro forte
de urina. Escada grande com degraus largos; divertia-me alucinadamente numa
bateria eletrônica invisível com baquetas presas na cintura e fones de ouvido –
era emprestada por um amigo –, sol e crianças correndo, gritos por todos os
lados, estou feliz, pois era um brinquedo que eu só via pela televisão. Areia e
óleo na minha cabeça que coça muito, piolho, estão a matá-los, sol quente e luz
transpassada, vejo uma fileira de crianças na mesma situação e as imagens se
confundem. No canto de uma sala enquanto todos ao redor ensaiavam alguma dança,
toco uma menina, nos tocamos, é bom. Estou no fusca bege de minha tia voltando
pra casa de pé apoiado entre os bancos da frente, falando sem parar na cabeça
dela – quase ouço minha voz – sobre o que eu havia feito na escola e sobre a
salada de escarola que eu chamava de rabiola – toco uma memória que não é só minha
e me perco nesse vulto – o vapor se desfaz e se refaz num refeitório bem
iluminado em volta, uma mesa comprida – me sinto bem e gosto do lugar.
Exploramos cada cantinho – grande, uma árvore em cima do parque, nos escondíamos
bem, reconhecendo nossos corpos e a eira do terreno descaído – suados seguíamos
a Vontade num encontro real. Ah, nesta
madrugada escrevi uma frase no muro do seu terreno, seguindo minha situação
íntima, espero que esta fundação sirva para lhe dar dignidade.
Não acesso aqui o que eu pensava
na época, ou talvez nem pensasse. Mas sei que inventava bem, aumentando as
experiências escolares no caminho de volta pra casa – nem tudo era dito,
sabemos. Também, devo lhe agradecer por cada ato, pois aqui sinto a criança natural
que eu fui, e assim persisto, assim persiste. Reconheço-me daqui, acessando um
núcleo de pureza;
Muito obrigado, do seu B.P.
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