quarta-feira, 24 de agosto de 2011

quarta-feira, 10 de agosto de 2011

vivo criativamente porque falo de encontro
todo gesto é um risco e uma ousadia
e tem dias em que a noite foi fogo
e carrega na pele desencontros
fugindo e buscando
mas sempre pensando em hospedar

uma curva veio e fragmentou tudo numa pendência com o todo
lombada concava distancia meu queixo do peito e encosta a nuca nas costas
me faz reconhecer o encaixe
um ponto cruz traz a tona o firmamento
tenho que responder

Tratado do rasgo



vagão : vago, vazio = incerteza do nosso tempo muitas vezes chamada de vazio.



Ah Juliano Pessanha e Teruo, que saltaram e se abrigaram no antes da partida, eu compreendi a raiz da minha dor sofrida em mim mesmo e senti no próprio corpo o apagamento do brilho e a aniquilação da intensidade e me tornei o que sou.
A simplicidade de minha tarefa se resume em transitar por estes vagões, no entre das coisas e em todas as cabines e compartimentos pergunto a cada um que encontro: você não tem saudade de ir para o lugar fora do trem? de quão longe você vem? quando você era ainda uma criança, em que espaço você estava? você não gostaria de rememorar como eram as coisas antes do embarque?
Vou na direção contrária dos mensageiros do nada que ao invés de rasgar as paredes deste vagão, só às decoram com imagens mortas e textos competentes. ESTOU PROTEGIDO E ABRIGADO NO ESTRANHAMENTO, estou exilado e sinto falta de lugar pois a dor própria do meu abrigo comunica que nós não pertencemos ao espaço comedido e saturado do interior deste trem. Estou num lugar de passagem e este não que digo para este lugar medido, diz um sim para uma outra pertença - um lugar aberto e sem medidas onde a jovialidade e a celebração podem acontecer.
Este lugar é passagem, é desejo de partir, pois experimentei até o fundo e rasguei a argamassa metálica desse "VAGÃO". Estou sentado num formigueiro da incandescência, no cometa onde a criança enlouquece de lucidez. Com minha cabeça de Jano olho para dentro desse trem que começa a sair do solo rumo a imortalidade biológica e meu olho da nuca olha para um pedaço de praia onde uma criança acaba de levantar os braços comemorando sua primeira aparição frente ao mar. Dizer o que sinto, dilacerado entre estes dois mundos - um adulto, rodeado de palavras por todos os lados e plantado direto no logos e destituído de qualquer experiência, e outro, da criança habitante real - é a minha posição atual, posição ambígua e difícil, de espião de umbral.

Se faz necessário imaginar um alfandegário da última fronteira e formular-lhe a seguinte pergunta: " Mas como é que passam por aqui os que por aqui passam?
E ouvir a seguinte resposta:"Passam sempre conduzidos pela dor, pois os que vêm do aberto, quando precisam circular no vagão, TÊM DE VESTIR UMA MASCARA QUE OS IMPEDE DE RESPIRAR, e os normalizados do trem, quando se dirigem para o simples, têm de deixar no vagão todo o uniforme da sua identidade. Eles só passam para lá nus".

Tudo isso caiu quando descobri que só tenho o olho da nuca e só sei enxergar com ele.
Sou um poeta OBSCURO

Mas tenho que transitar e voltar e criar um olho na frente - ai está o sintoma de minha patologia, eis minha doença, meu distúrbio dicotômico? - que me faça conversar com os homens sentados no compartimento, cujo corpo já mimetizaram a blindagem do trem e cujo o olho hipnotizado só consegue olhar para frente. Faço a mediação entre estes dois idiomas intraduzíveis; Dai o caráter trágico de minha situação, transcende-la e estar no iminente tranquiliza e anestesia este drama.
Sento no compartimento desse trem munido de minha máscara respiratória, que pode ser meu rótulo e minha identidade imaginária, e indago ao companheiro do lado: "Ei moço, ei senhor, mas como pode ser tão grande o apelo deste trem?". "O senhor não está percebendo que está incômodo por aqui?"

Se esses homens cutucados não experimentam com toda transparência o pavor e o horror pelo interior deste trem, é porque seu olho de trás dorme e está atrofiado.
Então eu num grito evoco a nostalgia e o pressentimento adormecidos neste homem e executo minha tarefa, acordo e aumento seu olho da nuca.
Eu posso fazer isso por que sou mensageiro e minha palavra mesmo que dita no interior do trem, foi colhida fora, num lugar sem arranjos onde a única medida é a amizade pelas coisas e pelos outros.

Este lugar não é produto de uma imaginação utópica, mas para onde somos arrastados sempre e quando o regime da aparência, regime do vagão - do "vago" - dá lugar à vibração do surgimento.

Um texto pode se tornar texto se ele for o idioma íntimo do destino de seu autor.





valeu Jerry Batista,Chiu, Macalão e todos que colaram nas Reflexões do burro no colativo 132
toda segunda terça-feira do mês rola, só colar.
Rua nilo 132, próx. ao Metrô Vergueiro
http://coletivo132.wordpress.com/
muito obrigado!

quinta-feira, 4 de agosto de 2011

ILHOTAS


a noite é rabiscada onde tem vermelho
desenho de água
aprendi a ver de cabeça para baixo


...



tudo corado
mar constante urra sem gênero
como sempre
sou lá fora desta fresta aqui dentro
e nós

vem pra cá pra deus nos desenhar


...


atraio crianças ao redor
tenho uma propensão poeta de ativá-las
cutuco absurdo levo tudo como aprendizado
acendo luzinhas coloridas no chão com a ponta da minha bota



...



eu me perdoo pelo pouco que sei
e deus me abençoa no muito que tenho de aprender


...

quis a noite toda
mas nossas blindagens luziram e ofuscaram

fiquei daqui vendo as estrelas dessa ampulheta
na certeza de um milagre horizontal como esse chão nas minhas costas

...


não saio de mim

pedra gozada
pedra gemida pedra arranhada
e a pedra do salto

céu e mar numa linha
um canto um grito pra África

...


arranquei meus joelhos
não matei nada além do tempo
e respondo a isso num lema que bate

atraída ela vem e venta branca como a praia

...


foi grande hoje e está em mim uma espera
próxima balsa trilha cortada e escura do peito até o estomago
lanterna o espírito e daqui sinto o céu ventar estrelas

...



estou na fresta ouvindo tudo de dentro
como quem não sabe nada
e não deixa nada além de pegadas
uma nova língua
um devaneio de infância
e uma praia na alma


...


sorri pra estrela
serei uma miragem nesta vida
sei digerir tudo
o dia e seu peso pediu outro
um de treinar a paciência

...

já estou em Pernambuco
chão batido crianças da terra e tudo que geme
eu estava preparado
águas claras pedras e pedro grande
mandando em nós e em tudo que rola
eu estava acordado
esperando vir mais





Boutique Bebé




Trabalho realizado na Boutique Bebé V.Nova Conceição.

Prainha Branca