quarta-feira, 3 de setembro de 2014

Correio

a caixa ia para maria aparecida das unhas e eu para terra preta
só queria comprar selos postais para continuar enviando cartas aos devaneios de infância
não tinha nada com aquilo
a gagueira que envergou a visão e fez ver errado
isso me salvou várias vezes
essa errância ocular enxerga tudo de um modo extra terrestre
sem pretensão ela conspira e eu só cumpro

Anel viário

os brilhos das fitas penduradas e as sombras delas
talvez nem exista mais isso que vi
Giordano Bruno canta ao fundo os diagramas de uma celulose
mandala no peito dando conta disso que arrebata

Divisa

a maturação é um estado onde se é visto nela
e dela pode-se dar uma informação precisa:
disse ao motorista do caminhão de cimento
enquanto ele girava
como pegar o retorno
tirei todos os anos anteriores das costas
me recolhi com eles e me senti integrado

Mata fria

túnel: deste lado também terá montanhas
são braços que me tomam aéreo numa expressão digital
nuvens rajadas que migram para detrás da encosta sugerindo uma nova geografia
arquitetando este lugar onde tudo canta

Ladeira de terra

o dia em que fui minha terra natal e que a cidade foi meu corpo e meu corpo transcendeu toda cidade
o dia em que caminhei em meu corpo - este estado errante
o dia que anulei meu corpo nos corpos das cidades me anulando em todos os corpos da cidade e que nisso visitei minha terra natal: o dia que eu e meu corpo chagávamos antes e isso não foi terrível

Cantareira

no jogo não basta a briga
tem que ter um mamute de fundo imitando os momentos benfazejos de minha infância
é nesse contorno que habito os sussurros no pé do ouvido
isso constrói uma casa que num efluxo chama tudo pra dentro numa leveza granítica
o batente organiza a abertura

Refogado

a velhice nas feridas da pata de um cachorro que treme
e o céu pondo o sol dentro da beira da serra
camada ancestral no antes ainda
se eu pudesse eu te cantaria a fumaça que sobe do cigarro de palha

Nenhum comentário:

Postar um comentário