Às esculturas com
miolo de pão
Estou tomando café com Clarice e
Pedro. É daqui que lhes escrevo sondando as imaginações de quando compunha suas
formas junto de meu avô. Imagino se já devaneava sobre a escultura social e
sobre as molduras de um corpo mutável. Sinto que ali, enquanto malaxava, tive
minhas primeiras noções esculturais: fazíamos formas ao nosso bel prazer,
juntando-as sobre a toalha manchada, entre as xícaras vazias, cascas e farelos
de pão, na mesa iluminada pela manhã solar do domingo – muitas arrastaram-se
assim, desdobrando-se sob esta luz adentrada.
Meu avô chega bem perto e, com
gracejos ao pé de meu ouvido, me pergunta o nome das formas que se criavam, uma
a uma. Nessas noções primitivas de plasticidade, visitei a possibilidade da
alternância, nomeação e icônicidade. As massas se acinzentando na gordura de
nossos dedos e nessa alethéia, aquilo que perpassava a manhã era moldado e nisso
éramos também moldados numa apreensão da possibilidade de alterar as coisas -
desdobramento no retirar da mesa sob o cheiro da borra, alimento comido, resto,
desvelo e esquecimento.
Agora devo me despedir, pois
Clarice está na mesa me olhando; sou chamado a transmitir esse tesouro, um de
nossos maiores amuletos ancestrais.
Sigo daqui, em vocês mais do que
nunca.
Muito obrigado, do sempre seu,
B.P.
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